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A prática de improbidade administrativa é hipótese que pode acarretar na inelegibilidade política para o exercício de cargo eletivo. A nova redação da Lei de Improbidade Administrativa, promulgada em 2021, também trouxe alterações relativamente à suspensão dos direitos políticos, com reflexos na temática da inelegibilidade.
Trataremos, nos tópicos seguintes, das alterações promovidas pela nova Lei de Improbidade Administrativa sobre o assunto, e, especificamente, de duas condutas previstas na Lei Complementar nº 64/1990, que, conforme julgados do Tribunal Superior Eleitoral e do Supremo Tribunal Federal, podem provocar a inelegibilidade do agente político ou do candidato(a).
O artigo 14 da Constituição trata do voto, do alistamento eleitoral e dos casos de elegibilidade e inelegibilidade. Com relação a esse último, o §9º versa especificamente que lei complementar tratará dos casos de inelegibilidade, “a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Assim, a própria Constituição relaciona improbidade e inelegibilidade, determinando ao legislador que discipline em lei específica os casos em que o agente perderá a capacidade de ser eleito em decorrência de ato ímprobo.
Essa lei é a Lei Complementar nº 64/1990, e, dentre os seus artigos, há duas hipóteses que correspondem à maioria dos casos de inelegibilidade julgados no Poder Judiciário: 1) a rejeição de contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas pelo candidato e 2) a condenação judicial por improbidade administrativa.
Em todo o pleito eleitoral, muitos políticos e candidatos que exerciam cargo no Poder Executivo são impedidos de concorrer, ou mesmo têm cassados os seus mandatos, por aplicação da sanção decorrente da rejeição das contas.
Essa penalidade está prevista na LC nº 64/90:
Art. 1º São inelegíveis:
I - para qualquer cargo:
(...)
g) os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes, contados a partir da data da decisão, aplicando-se o disposto no inciso II do art. 71 da Constituição Federal, a todos os ordenadores de despesa, sem exclusão de mandatários que houverem agido nessa condição;
O atual posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que o ato que ensejou a rejeição das contas deve ser insanável e configurar ato doloso de improbidade administrativa. Isto é, nem toda desaprovação de contas gera automática inelegibilidade[1].
O próprio tribunal delimitou 5 requisitos que devem estar presentes para que a rejeição de contas seja qualificada como causa de inelegibilidade[2]:
1) Rejeição de contas;
2) Exercício de cargo ou funções públicas;
3) Irregularidade insanável que configura ato doloso de improbidade administrativa;
4) Irrecorribilidade da decisão;
5) Inexistência de provimento judicial que suspenda ou anule a decisão proferida pelo órgão competente.
A Lei Complementar 64/90 é taxativa ao estabelecer a configuração do ato doloso de improbidade administrativa como condição para a configuração da causa de inelegibilidade decorrente da rejeição de contas públicas. Disso temos que, para a Lei de Inelegibilidade, o ato de improbidade administrativa culposo não configura situação ensejadora da sanção de inelegibilidade.
Com relação à configuração do ato de improbidade doloso, até então o entendimento da Justiça Eleitoral era o de que não se necessitava de dolo específico, mas tão somente o dolo genérico para se atrair a incidência da hipótese acima transcrita. Contudo, a nova Lei de Improbidade Administrativa de 2021 exige especificamente o dolo específico para a condenação de agentes públicos em ato de improbidade.
O dolo genérico é compreendido como aquele em que o administrador assume os riscos de não atender aos comandos constitucionais e legais que pautam os gastos públicos[3]. Já o dolo específico veio delimitado no §2º do artigo 1º da Lei de Improbidade Administrativa: “considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado, (...) não bastando a voluntariedade do agente”.
Sobre a nova configuração de dolo para o ato de improbidade, citamos Marçal Justen Filho[4]: “apenas existe improbidade nos casos em que o agente estatal tiver consciência da natureza indevida da sua conduta e atuar de modo consciente para produzir esse resultado. Ou seja, a improbidade é uma conduta necessariamente dolosa.”
Assim, diante da possível incompatibilidade entre o posicionamento até então adotado pela Justiça Eleitoral e da nova redação da Lei de Improbidade Administrativa, aguarda-se uma possível mudança de posicionamento e consolidação do entendimento nos pleitos eleitorais de 2022 e 2024.
O entendimento atual é o de que não é necessária a menção de improbidade administrativa na decisão que rejeita as contas. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral[5], basta que a Justiça Eleitoral consiga extrair do teor da referida decisão (ratio decisum) a ocorrência de atos de improbidade administrativa para a configuração da hipótese prevista na lei de inelegibilidade.
Podemos retirar da jurisprudência eleitoral alguns exemplos de atos que ocasionaram o sancionamento do administrador:
O art. 1º, I, l, da LC nº 64/1990 traz também como causa de inelegibilidade a condenação judicial à suspensão dos direitos políticos pela prática de ato doloso de improbidade administrativa. Contudo, similarmente à hipótese dos tópicos anteriores, nem toda a condenação em improbidade administrativa leva necessariamente ao sancionamento pela lei de inelegibilidade.
Transcrevemos a lei:
Art. 1º São inelegíveis:
I - para qualquer cargo:
l) os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena;
O atual entendimento do Tribunal Superior Eleitoral[6] elenca a necessidade da presença de alguns requisitos para o sancionamento deste artigo:
1) Condenação à suspensão dos direitos políticos;
2) Decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado;
3) Ato doloso de improbidade administrativa;
4) Ato que tenha ensejado, cumulativamente, lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
É também possível que a Justiça Eleitoral indefira o registro de candidatura com base na análise de condenações, se a Justiça Comum reconheceu a existência simultânea de prejuízo ao erário e de enriquecimento ilícito por ato doloso de improbidade.
Similarmente à rejeição de contas, não é necessário que conste no dispositivo da decisão judicial o enriquecimento ilícito e o dano ao erário[7]. Cabe à Justiça Eleitoral realizar o exame da fundamentação a partir do teor da decisão para analisar a existência das duas causas de improbidade.
A condenação por ato de improbidade fundada apenas no art. 11 da LIA (atentar contra os princípios da administração pública) não enseja a aplicação da condição de inelegível.
Consoante o art. 11, § 10, da Lei 9.504/97, "as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas no momento da formalização do pedido de registro da candidatura, ressalvadas as alterações, fáticas ou jurídicas, supervenientes ao registro que afastem a inelegibilidade".
Embora se trate de tema com alguma controvérsia, o entendimento adotado nas últimas eleições de 2020 foi o de que o marco temporal para as condições de elegibilidade e inelegibilidade é o momento do pedido de registro da candidatura.
Se houver algum fato superveniente que possa modificar esse status, a jurisprudência do TSE afirma que a data limite para a modificação do caráter de inelegível, em razão desses fatos, é o último dia da diplomação dos eleitos[8].
[1] RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060004579, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 14/12/2020.
[2] RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060011384, Acórdão, Relator(a) Min. Carlos Horbach, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 202, Data 04/11/2021.
[3] Agravo Regimental no Recurso Ordinário Eleitoral 0601011–51, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, PSESS em 26.10.2018
[4] JUSTEN FILHO, Marçal. Reforma da lei de improbidade administrativa comentada e comparada: Lei 14.230. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022, p. 25.
[5] RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060054067, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 150, Data 16/08/2021.
[6] RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060037514, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 150, Data 16/08/2021.
[7] Ac.-TSE, de 21.2.2017, no REspe nº 10049
[8] (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060020987, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 198, Data 26/10/2021)
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